Alinhando expectativas - A confissão de Pedro

 



 Nós temos 4 evangelhos, ou seja 4 relatos da vida e obra de Jesus Cristo. “Evangelho” é uma palavra que vem do grego. Quando o imperador tinha uma notícia para o bem da humanidade, ele trazia consigo o evangelho, ou seja, uma boa notícia, e foi emprestando essa palavra do contexto imperial que os evangelistas trouxeram para o mundo essa boa notícia. Mas que boa notícia é essa? A tão esperada chegada do Messias prometido do Antigo Testamento, aquele que viria para acabar com o jugo do pecado, aquele que reconciliaria a humanidade com Deus, aquele que pisaria na cabeça da serpente.


Destes 4 evangelhos, 3 são considerados sinóticos, ou seja, são 3 obras sobre Jesus que tem a mesma ótica, apesar de perspectivas diferentes. A preocupação de Marcos é persuadir os romanos ou gentios, os que não eram judeus, então a preocupação de Marcos está no seu público alvo entender quem Jesus era, tanto para judeus, como para o mundo. Já no evangelho de Lucas, sua preocupação é a apuração dos fatos nos detalhes. Já Mateus escreve para os judeus, então veremos um Jesus messiânico, com referências diretas às profecias do Antigo Testamento, sem muita preocupação de Mateus em explicar a tradição ou cultura judaica. E é no contexto deste evangelho que vamos nos deter.


Leitura: Mateus 16:13-20 (Marcos 8:27-30; Lucas 9:18-21)


Mateus começa nos ambientando em onde ocorreria essa passagem: Cesareia de Filipe, cidade que foi renomeada por Herodes Filipe II, filho de Herodes o Grande, aquele que perseguiu Jesus na infância, fazendo com que José e Maria levassem Jesus para o Egito. O nome da cidade se deu em homenagem a César e Herodes Filipe II, Cesareia de Filipe. Antes dessa mudança de nome a cidade se chamava Banias, um derivado do deus Pã que na mitologia grega era um deus metade homem e metade bode que morava nas montanhas e teria uma função protetora aos pastores e rebanhos. Então Jesus leva seus discípulos a uma cidade que adora um deus metade homem e metade bode que cuida dos rebanhos e pastores? O que ele pretendia? Hummmmm, vem coisa boa aí! Já no primeiro versículo Jesus lança: “Quem os outros dizem que o filho do homem é?”

Então diante deste lugar que exala idolatria e falta de conhecimento sobre quem Deus é, ele pergunta, quem os outros estão dizendo que eu sou? E então começa uma enxurrada de respostas: ah é João Batista, é Elias, é Jeremias, ou qualquer outro profeta. Ou seja, o que Jesus queria com essa pergunta? Saber o que Ele significava para os “outros”. E diante as respostas podemos entender que os “outros” tem conhecimento da tradição e cultura judaica, pois os personagens citados são personagens conhecidos do povo judaico. Entendido isso nós podemos olhar para esses personagens para entender o que os “outros”, que olhavam para Jesus, entendiam, ou até pretendiam com Ele.


Primeiro vamos a definição de profeta, o povo dizia que Jesus era um dos profetas, mas o que era ser um profeta?

Em Deuteronômio 18:18 Deus nos dá essa resposta: “Levantarei do meio dos seus irmãos um profeta como você (Moisés), em cuja boca porei as minhas palavras; ele dirá a vocês tudo o que eu lhe ordenar.” E por que isso aconteceu? Quando o povo saiu do cativeiro egípcio, Deus em dado momento no deserto do Sinai quis conversar com seu povo, mas o povo ficou com tanto medo que pediu para Moisés falar com Ele, e a partir desse momento, Deus começou a levantar pessoas, profetas, os quais ele colocaria Sua palavra na boca desse profeta.

João Batista: Quem foi? Onde viveu? O que comia? O que vestia? O relato bíblico de João Batista não nos mostra alguém muito preocupado com a moda, afinal ele vestiu pele de camelo. João vivia no deserto, ou seja, a preocupação dele estava em se desconectar do mundo, para se conectar mais com Deus. João foi o profeta que veio para preparar o caminho para a chegada do messias, ele tinha uma pregação muito dura, baseada em arrependimento e confissão. A pregação de João gerava arrependimento.

Elias: Elias foi um profeta que se posicionou contra idolatrias de reis de Israel, principalmente contra Acabe, e com certeza seus milagres e sinais maravilhosos são o ponto alto de seu ministério. Elias não morreu, foi levado aos céus por uma carruagem de fogo. Há uma passagem sobre uma viúva, que está quase sem comida, e Deus através de Elias multiplica seu alimento. Depois o filho da viuva fica muito doente e para de respirar, Deus através de Elias revigora a vida do menino, então no final dessa perícope nós lemos: "Agora sei que tu és um homem de Deus e que a palavra do Senhor, vinda da tua boca, é a verdade". A pregação de Elias gerava fé.

Jeremias: Jeremias foi o profeta sofredor, conhecido como profeta chorão. Jeremias profetizou contra Judá, ou o reino do sul de Israel. Suas profecias são muito pesadas, o relato de Jeremias sobre o que estava acontecendo em Judá naqueles dias é tão terrível que chega a ser nauseante, mas no final de seu livro, suas profecias falam de um povo que reconheceria Deus, que perderia seu coração de pedra e ganharia um coração de carne, um coração que poderia reconhecer o Messias. A pregação de Jeremias gerava esperança.


Então segundo a resposta dos discípulos, para os “outros”, os ensinamentos de Jesus vinham de Deus, os outros reconheciam Jesus como um profeta que detinha a palavra do próprio Deus em sua boca, e mais, suas palavras geravam arrependimento, fé e esperança. E eles não estavam errados, os “outros” conseguiam enxergar várias características de Jesus. Mas também para os “outros”, Jesus não poderia ser o Messias porque faltavam características para isso. Eu não consigo entrar em detalhes sobre essas características, mas os “outros” esperavam um messias com poder bélico e militar, que livraria os judeus do jugo romano e cumpriria seu papel não só como profeta, mas como sacerdote e rei, alguém influente que traria paz ao mundo e reinaria no mundo inteiro. Todas estas características foram profetizadas no antigo testamento, e se estão na bíblia, são Palavra de Deus, se são Palavra de Deus, vão acontecer. Ou seja, para os “outros” Jesus era de fato incrível, mas ainda não era tudo que esperavam. Ele não era o Messias.

Então na sequência Jesus dirige uma nova pergunta aos discípulos: “E vocês? Quem vocês dizem que eu sou?” Neste momento não houve tantas respostas, parece que eles também tinham dúvidas. Então Simão Pedro, tomado pelo Espírito Santo responde: “Tu és o Cristo, o filho do Deus vivo”. Vamos tentar explicar a profundidade desta afirmação. E não vai ser simples.

Em Gênesis 1:1 está escrito: “No princípio Deus…” nessa porção de versículo nós temos contato com muitas verdades importantes: 1. Deus é eterno e já existia antes de qualquer outra coisa; 2. Deus estava satisfeito em Sua própria presença; 3. Deus transbordava de amor entre suas 3 pessoas ( Pai, Filho e Espírito Santo); 4. Deus não precisava de mais nada, mas mesmo assim decidiu transbordar esse amor em uma coisa que ele chamou de criação.

A partir daí vocês já sabem, Deus criou o homem, Deus se relacionou com o homem, o homem pecou e Deus não pôde mais continuar esse relacionamento, porque Deus não se relaciona com o pecado, Deus odeia o pecado. Nesse momento, em Gênesis 3:15, Deus faz a promessa que vai perpetuar por todo o AT (um filho da mulher que pisará na cabeça da serpente, e ela lhe ferirá o calcanhar) e essa promessa vai sendo revelada de forma gradativa, e por pelo menos 4000 anos (de uma perspectiva conservadora) todos estavam esperando por essa promessa. E se não bastasse isso, existia um silêncio ensurdecedor de 400 anos em que Deus não falou ao seu povo por meio de profetas. Precisamos entender que os “outros” não estavam sendo céticos, “Ah, tragam esse tal de Jesus e deixem que ele nos prove que é o messias”. NÃO. Os “outros” só estavam com a expectativa errada. Diante disso, a dúvida que pairava no coração de todos, era plausível, porque eles ainda esperavam a guerra contra os romanos, eles esperavam a conquista da liberdade pela espada através do messias salvador e libertador de um povo que estava em um cativeiro real, humano, mundano. Todos estavam esperando ser libertos pela força da própria espada, todos queriam lutar pela sua própria salvação, ao lado do rei messias.

Mas não era isso que estava acontecendo, não havia um vislumbre de guerra, nem de Jesus se tornar rei, nem sacerdote. E é no meio de toda essa dúvida e até frustração dos outros que Simão responde: “Não importa o que nós estamos pensando, falando ou esperando, o que nós pensamos, falamos ou esperamos não muda quem Você é, e Tu és o Messias, o Cristo, o Ungido do Senhor.” E é claro que Simão não falou isso porque ligou os pontos e de forma lógica e racional e entendeu quem Jesus era. Não, Jesus explica o por que Simão consegue fazer esse caminho, como Simão consegue dar essa resposta. Porque não foi uma resposta racional, não foi uma resposta lógica, não foi uma resposta empírica, não foi uma resposta de carne e sangue. Mas foi uma resposta espiritual, uma resposta revelada pelo Pai através do Espírito Santo.

Porque em João 6, Jesus fala que O Pai nos revela o Filho através do Espírito, o Espírito testifica em nós essa filiação e essa crença de que Deus entregou seu Filho, para que pisasse na cabeça da serpente, e ela lhe ferisse o calcanhar, Ele morreu, mas venceu a morte e ressuscitou, nos dando assim vida eterna. E diante a essa revelação que foi dada a Simão, que é dada a nós, Jesus prossegue: “E eu lhe digo que você é Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha igreja, e as portas do inferno não poderão vencê-la.” Jesus muda o nome de Pedro, assim como Deus fez com Abraão, Sara, Jacó e tantos outros, não só mudando seus nomes mas suas identidades. Jesus muda o nome de Pedro e explica a importância da revelação que o Pai deu a ele através do Espírito: Esta confissão, esta revelação que veio até Pedro, pelo Pai e através do Espírito Santo é o fundamento da Igreja. Na carta aos Efésios, Paulo escreve no cap. 2, versos 19 a 21: ”19 Portanto, vocês já não são estrangeiros nem forasteiros, mas concidadãos dos santos e membros da família de Deus, 20 edificados sobre o fundamento dos apóstolos e dos profetas, tendo Jesus Cristo como pedra angular, 21 no qual todo o edifício é ajustado e cresce para tornar-se um santuário santo no Senhor.” E pelo simples fato que Deus participa de todo o processo da conversão do crente e da edificação da igreja, Jesus pode falar com toda certeza, que as portas do inferno não prevalecerão.

E Jesus termina sua fala, com uma afirmativa sobre a fundação de sua Igreja, através da autoridade apostólica, começando por Pedro, mas depois, como é possível ler em Mateus 18:18, expandida a todos os apóstolos. “Eu lhe darei as chaves do Reino dos céus; o que você ligar na terra terá sido ligado nos céus, e o que você desligar na terra terá sido desligado nos céus”. Jesus está afirmando aqui que através do Espírito Santo, os apóstolos teriam autoridade para fundamentar a igreja, doutrinar a igreja, estabelecer Sua igreja. E é exatamente isso que acontece através dos escritos do Novo Testamento.


Meus irmãos, o Pai te escolheu, o Filho permitiu que você ouvisse o chamado e o Espírito te chamou de forma tão eficaz que não há como não aceitar esse chamado. A confissão de que Jesus é o Messias prometido, único Senhor e Salvador é colocado em nosso coração por Deus, que nos sustentará até que possamos nos reunir a Jesus, como sua Noiva.


De fato, os “outros” entenderam que a palavra de Deus estava na boca de Jesus, eles só não entenderam que Jesus era o Próprio Deus, que Jesus era o Messias, a promessa de Gênesis 3:15. Não porque lhes faltou sabedoria, muito menos zelo, mas porque lhes faltou o Espírito Santo. Que nós possamos entender meus irmãos que o que nos diferencia dos “outros” é Deus, nos escolhendo, nos salvando e habitando em nós. Que nós possamos orar para que a mesma revelação que Pedro teve, nós possamos ter também, que possamos reconhecer Jesus como Ele realmente é, e não nos percamos em expectativas sobre o reino que são só sobre nós e não se preocupam com o Reino de fato.


Com amor em Cristo, Jean Santos.

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